sábado, 8 de março de 2008

Conakry, República da Guiné – quinta-feira, 6 de Março de 2008

Depois de quase um mês na ausência de notícias, escrevemos para dizer que vamos repetir a dose. - “Desole!”
Em boa verdade não têm havido grandes novidades desde o ultimo relato no que diz respeito a paisagens ou experiências. Correndo o risco de ser contraditório, arrisco-me a dizer pelos três que a informação é tanta, que é difícil prendermos a atenção e algo específico para relatar nestas páginas electrónicas que nos unem apesar da distância física. Quando saímos de Conakry retornamos à aldeia de Sangbarala e de lá voltamos inesperadamente para Conakry de onde escrevemos agora para transmitir nova partida para a aldeia já amanhã. Atravessaremos o “Djoliba” pela “terceira” vez numa das pirogas de serventia da aldeia e esperamos que este terceiro reencontro seja tão animador e caloroso como o segundo – do qual infelizmente não tiveram notícias. Entre Conakry e Sangbarala dividimo-nos em entrevistas e registos esporádicos. Ficamos temporariamente sem telemóvel (que já recuperamos) e continuamos sem registar furos ou avarias de maior alarme na nossa companheira Aurora. O novo e deslumbrante vai caindo aos poucos na banalidade e apesar de já não haver muito para ver, sentimos sempre que ainda vimos pouco. A babilónica favela dos arredores de Conakry torna-se cada vez mais pesada, e não planeamos cá voltar, definitivamente. Quanto à aldeia de Sangbarala, por mais que nos identifiquemos com ela e com tudo o que a envolve, sentimos que permanecer lá muito mais tempo seria como que uma perda desse mesmo tempo uma vez que a Guiné tem muito mais para dar. Por estas razões rumamos após escala forçada em Sangbarala (para mais duas entrevistas) à região do Faranah, onde esperávamos encontrar-nos com Fadoubá Oularé que soubemos anteontem ter falecido esta semana de forma repentina. Este facto entristece-nos a alma bem como à de todos os Malinké que reconhecem na figura de Fadoubá uma mestria inigualável na arte de fazer soar o Djembé. Nascido na década de 30, destacou-se também como o primeiro solista dos Ballets Africains formados em 1959 pelo antigo regime da Primeira República de Sekou Touré que fez frente aos Colonizadores franceses e instituiu os Ballets como a face cultural da Guiné a mostrar ao Mundo. Dado o seu repentino falecimento, espero poder conhecer o seu filho e extrair-lhe respeitosamente alguma da informação que esperava obter do seu pai. A percussão Malinké e o mundo do Djembé ficaram mais pobres esta semana, e o nosso filme também…













Tristezas e lamentos à parte, fez precisamente ontem, dia 5 de Março, três meses que carimbamos a nossa entrada nas fronteiras da Guiné e achamos que talvez já seja demasiada a nossa permanência no país. Mais do que isto, é chover no molhado chão que parece estar sempre seco! Apesar de possuirmos vistos até meados de Abril, imaginamos abandonar o país cerca de duas semanas antes destes expirarem. Mas até lá ainda nos esperam muitos quilómetros de estradas esburacadas e poeirentas, Guiné adentro. Isto para dizer que além da região do Faranah tencionamos ainda visitar a região da floresta, no sul da Guiné. Floresta esta de ambiente tropical e com uma fauna e flora de fazer inveja à generalidade das regiões africanas. Segundo a Bíblia (Lonely Planet – West Africa) arriscamo-nos entusiasticamente a encontrar os animais que normalmente figuram nos documentários e livros sobre a vida selvagem africana e cujos nomes me vou escusar a descriminar com receio dos normais alarmismos lusitanos que já tivemos oportunidade de sentir aí desse lado do Mediterrâneo. Nada de grave, está tudo controlado, como sempre! – Os leões não gostam do asfalto!! Era também de grande valor subir ao Monte Nemba, que personificado pela estátua com o mesmo nome serve de símbolo iconográfico ao país que mais tempo nos acolheu nesta viagem. Teremos ainda oportunidade de procurar, na região de Fouta Djalon a nascente do Djoliba, o Rio Níger, terceiro maior rio do Continente Africano, com cerca de 4100 quilómetros de extensão, artéria natural que serpenteia até ao coração africano passando pelo Mali, roçando o deserto do Sahara, atravessando o Níger e o Benim, desaguando finalmente na Nigéria num emaranhado de pântanos e canais. Sem este gigante africano a Africa Ocidental não teria esta verdura fascinante e creio poder dizer que a sua história e geografia não seriam certamente as mesmas.


Depois de matarmos a curiosidade sobre o que poderemos encontrar pela Região Florestal, conhecida como “Guiné Forestier”, retornaremos à tão amada aldeia de Sangbarala onde contaremos os trocos que nos restam para o regresso e onde recuperaremos o fôlego que bem falta nos vai fazer.Antes de me despedir destas teclas por tempo indefinido sinto-me forçado a referir que enquanto permanecemos em Sangbarala, da última vez, conhecemos o polaco Wojtek e a sua namorada irlandesa Norah que apanharam boleia connosco para Conakry a bordo da Aurora. A Norah já partiu para a polónia e o Wojtek fica por cá mais um mês e meio entretido entre aulas de percussão, sardinhas enlatadas, maionese e ananases frescos. Este casal peculiar faz uma excelente parelha com o espanhol Miguel, cuja presença já referimos em textos anteriores. O humor cáustico e desmedido destes personagens juntou-se de forma efervescente ao nosso e foram várias as vezes em que se referiu a sorte que todos tivemos no cruzamento dos nossos caminhos. Pessoalmente, ri-me à fartazana como há muito não fazia e enquanto escrevo estas linhas recordo sorrindo as caras do Ricardo e do Mando nalgumas situações caricatas que vivemos, desta vez num conjunto mais alargado do que o do trio do costume. Receio não haver boas fotos deste casal, mas fotos do Miguel certamente não faltarão. Isto porque o espanholito “comprou” bilhete de subida, na Aurora e Africa acima, até Marrocos onde se instalará cerca de um mês a estudar a percussão da região, como já vem feito desde há anos, pelos mais diversos cantos do mundo por onde já teve a sorte de espalhar com brio o seu sentido de humor tão característico.



A sua subida a bordo da nossa Aurora está prevista acontecer em Bamako, capital do Mali, onde combinamos encontro, por onde já passamos a caminho da Guiné e onde ainda retornaremos antes de rumarmos ao “País Dogon”, também no Mali. Este “país” dentro de outro país, refiro em tom de esclarecimento prévio, é descrito na Bíblia como um dos dez locais do mundo a visitar antes de morrer. E nós, destemidos cavaleiros do asfalto africano (com toda a terra e poeira que isso representa), apesar de confiantes no destino, não sabemos o que a sorte ou o azar nos reservam e não nos vamos arriscar a nunca vislumbrar tamanha beleza. Fica portanto dada a dica, temos desvio marcado por quatro ou cinco dias para o “País Dogon”. – Também em tantas semanas, não serão uns dias que farão grande diferença no ritmo crescente da saudade que já nos assola deste lado e que sentimos já assolar muita gente desse lado. É de referir também que as altas temperaturas que se vão fazendo sentir nesta região de Africa não nos convidam a permanecer nela muito mais tempo. Desde que cá chegamos não tem sido difícil de comprovar que o calor africano pode sempre aquecer mais um pouco e pleonasmos à parte, nota-se bem a diferença entre a temperatura da nossa chegada e a da nossa partida. Está quente, muito quente!
















Sem mais assunto a atravessar-me a mente, envio para Portugal a certeza da nossa boa saúde, disposição e humor, esperando receber em troca compreensão pela falta de textos e de pressas no regresso.


Até já!

Texto: Nuno Ribeiro

Fotos: Ricardo Leal

Mentor: Armando Santos

6 comentários:

Anónimo disse...

Sempre que aqui venho banhar-me nos vossos textos, deslumbrar-me com estas imagens e outras que têem aparecido, sinto uma vontade de saltar para aí... Mas, chega de sonhar. Desta vez também gostei de sentir nas vossas palavras a "Saudade" que já aperta e como tal vou partilhar convosco e com quem vos visita neste blog este poema:
SAUDADE

Saudade é o que se desconhece
O que parte sem despedida,
uma imagem que não fica esquecida,
uma ausência que entristece

Saudade- Fado sem encanto e sem eternidade...
Uma ilusão que se quebra-um coração sem metade

Saudade- Contemplar de uma estrela
que nos marcou demais
e hoje se ofusca e se apaga, sem
um pouco de Paz

Saudade: carta que não se envia,
orgulho que enlouquece,
distância de quem se ama
e sendo SAUDADE...Permanece

Beijos grandes para os três e continuem a enviar textos e fotos.Geijão grande Ricardo da mãe, paizão e mana,beijossssssss

Miguel Brázio disse...

Amigos,
Viajar é quase, quase estar a chegar!
Mantendo a perspectiva do final não haverá obstáculos insuperáveis.
Deixai-vos seduzir pela oportunidade duma viagem feliz.
Até um dia destes.

Rita Santos disse...

Heia morenos bigodaços, como vão as coisas por ai? É só mesmo para vos mandar um grande abraço e uma palavra de saudade desta gente toda que diariamente pergunta por "e os Gajos"? E de curiosidade..., dessas aventuras e registos e projectos e energias que tá tudo aceso por partilhar.
Não está a ser fácil a venda dos instrumentos, a ver se divulgam aqui, pode ser que ajude.
E tudo de bom neste regresso,... muita sorte, bom tempo, continuação de grandes histórias e luminosas surpresas e, até já!

Estação do Reggae disse...

e quê, uma festa de recepçãozinha dia 18 ou 24 que dizem?

reggae roots
apresentação da radio estação do reggae
e recepção dos conacrys?

que dizem?

ervilha disse...

allo allo leal!!!
quando é q chegam a terras lusitanas?não posso faltar à grandiosa recepção e partilha de momentos tão mágicos!!
continuação de boa viagem!
beijos e abraços de saudades*
sofia

winga disse...

pessoal, muito bem. Os meus sinceros parabéns, não percam nunca essa força. Coragem.
winga